Há muito tempo atrás existia uma pequena civilização que vivia em algumas ilhas dos mares do sul. Lá, conta-se em lenda, uma estranha relação foi mantida entre o deus local e seu povo.
COOBA, como era chamado, criou aquele povo à sua imagem e semelhança e tinha muito apego à sua criação. Esse apego era tanto, que ele atuava diretamente nas vidas das pessoas.
COOBA, como era chamado, criou aquele povo à sua imagem e semelhança e tinha muito apego à sua criação. Esse apego era tanto, que ele atuava diretamente nas vidas das pessoas.
Pode parecer estranho, mas COOBA aconselhava, pessoalmente, todas as suas criaturas humanas. Sendo onipresente, como um bom deus deve ser, estava atento a todos os momentos de dúvidas da população. Se alguém ia casar... consultava COOBA! Se a moça ia viajar e a família tinha dúvidas se deixava ou não... perguntava-se a COOBA! Na hora de trocar de canoa por um modelo mais atual... de novo, vamos ouvir COOBA!
Não! Não pense que ele achava isso chato ou enfadonho. Ele adorava! Mas, os problemas logo começaram a surgir. Quando alguma coisa não dava certa, ou exatamente do jeito que a pessoa queria, a culpa era de COOBA! E lá ia o cidadão se queixar com o senhor seu deus.
Imagine então que ele participava de todas as demandas de seu povo. Milhares e milhares de pessoas e suas indecisões. Das mais simples, como: - o quê vestir? Ou das mais complexas como: - Vamos guerrear?
Matematicamente podemos imaginar o número enorme de insatisfeitos. COOBA começou a se aborrecer com tantas reclamações.
Não aguentou mais que uns punhados de milhares de anos e teve uma súbita idéia: livre arbítrio! Um pensamento brilhante! Coisa de um deus mesmo: cada um que tomasse a sua decisão daqui para frente e ponto final! Mas, COOBA foi, além disso, e resolveu agir diferente.
Ele se posicionou acima da cabeça das pessoas, ficava sentado, se equilibrando, bem no alto da cabeça de cada um dos seus seguidores. Todos podiam ver! Como se fosse pequenos Budas sendo equilibrados pelas pessoas.
Dessa posição, ele olhava tudo, acompanhava as pessoas, ouvia todas as conversas, mas não se manifestava! De quando em vez, quando uma pessoa ficava em dúvida diante da necessidade de tomar uma decisão, ele se desequilibrava e caia sobre a pessoa. No tombo sempre batia no ombro, no braço, no joelho ou pé. Isso doía muito. Sempre tinha alguém se queixando da dor que COOBA havia lhe imposto.
Tudo por culpa do livre arbítrio!
Então se tornou um hábito naquele antigo povoado nas ilhas dos mares do sul comentar nas ruas: - Onde COOBA está lhe doendo hoje?
Vamos transportar isso para os nossos dias!
Viver é estar constantemente tomando decisões. Lógico que isso gera angústia em vários níveis diferentes. E nem sempre é só pelo resultado, que pode até ser positivo, mas pela própria dissonância cognitiva criada no processo, pela ansiedade desencadeada após a tomada e, isso é o pior, pelo grande número de decisões que temos de tomar todos os dias.
Esse movimento, quando não devidamente resignificado e transformado em gasolina para o nosso motor, pode gerar as tão conhecidas doenças psicossomáticas.
Então a culpa é do livre arbítrio?
Sem ter alguém para culpar pelas nossas decisões (somos ou não somos responsáveis por elas?) nos vemos imediatamente sozinhos com a responsabilidade. Isso é bom, quando sabemos administrar com equilíbrio e bom senso. O segredo está em como pensamos isso e não como pensamos sobre isso.
Nós não conseguimos lidar direito com coisas óbvias como a morte, por exemplo.
Pense bem! Mas só responda depois de pensar bem. Porquê choramos quando morre alguém? Pelo destino cruel dele que se foi, ou pela falta que ele vai fazer para nós? Melhor ainda: por que diante da morte dele, eu me recordo que também vou morrer?
Então, COOBA deve estar caindo agora pelos seus ombros, não dá para ficar se equilibrado em cima de uma cabeça que gira!
Provocações como estas nos fazem refletir um pouco sobre nosso projeto individual. O que estamos realmente preparando para a pessoa mais importante do mundo? (Lógico! Estou falando de você!)
Para onde estão indo todos os minutos gastos em pensamentos perdidos sem construções objetivadas? E de que nos serve lamentar o que não pode ser resolvido? Aceito ou não aceito o poder que me foi concedido de ser dono do meu destino?
Eu aceito!
E tem mais, não reclamo quando algo me cai da cabeça e machuca o ombro, o braço, o joelho ou o pé. Sei que serei capaz de levantar de novo e me equilibrar.
Me salve Pablo Neruda...
“Sou só uma rede vazia diante dos olhos humanos na escuridão e de dedos habituados à longitude do tímido globo de uma laranja. Caminho como tu, investigando as estrelas sem fim e em minha rede, durante a noite, acordo nu. A única coisa capturada é um peixe dentro do vento.”
João Oliveira é Psicólogo – CRP 05-32031
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