A história que vou contar agora é absolutamente verdadeira, juro pelos meus
cabelos! Pode até ser que você não acredite, mas isso não é problema meu. Sinto
que devo compartilhar e pronto: agora vou falar!
Estava caminhando pela orla, em um dia de sol (vide foto) quando percebi que
estava sendo seguido de perto por alguém. Me virei e notei uma sombra escura
pairando no ar. Algo realmente medonho e que, no primeiro momento, me assustou.
Mas, a sombra foi se materializando e percebi que era o estereótipo da morte e,
como bom psicólogo que sou, deduzi que estava tendo uma alucinação positiva
devido a quantidade de água de coco que havia bebido momentos antes.
-
Bom dia senhor João, sou Azrael, o anjo da morte e seu xará em árabe (Xuão).
Podemos conversar um pouco?
A voz grave que saia debaixo do capuz não me assustou. Mas, a possibilidade de
ser xará do anjo da morte era algo que até então não sabia.
-
Claro que sim xará, quer se sentar aqui no quiosque? – Disse sorridente.
-
Porque não? Claro! Nossa conversa pode ser longa.
Dito isso, nos sentamos no antigo Quiosque Le Trois na reta da Siqueira Campos,
Posto 3.
- Sabe – disse a Morte em seu tom cavernoso – Estou com um pequeno problema e
preciso de sua ajuda para resolver. Veja aqui essa minha agenda.
Colocou em cima da mesa um monte de papeis velhos com inscrições impossíveis de
se ler.
- Nosso encontro estava agendado para amanhã... veja aqui: um ônibus
desgovernado na esquina da Constante com Nossa Senhora... as 10h45 da manhã.
Parece que o senhor estava indo na farmácia comprar... bom, isso não é de meu
interesse. Está vendo aqui?
- Como é que é? Eu vou morrer amanhã?? – Disse já me arrumando para sair
correndo.
- Calma, calma... o problema é justamente esse. Amanhã tenho um atentado em
Cabul, um avião que cai na Ásia e uma situação de terremoto aqui nessas ilhas –
disse apontando no mapa para um ponto no pacífico.
-
Então – continuou a morte – Tenho de fazer escolhas, assim como todo mundo, e
não poderei estar por aqui nessa hora. Dessa forma, o senhor não irá morrer
amanhã.
-
Mas, isso é uma boa notícia, não é?
-
Para o senhor talvez sim...Para mim não. Ocorre que temos um protocolo muito
sério e o senhor têm um monte de padrinhos no departamento. Veja só a lista
(puxou outro papel velho cheio de rabiscos e desenhos infantis): Indra, Anúbis,
Emothep, Jagannath ... pera aí? Quem é Ultra Seven?
-
Como o senhor disse: um de meus padrinhos poderosos. Mas, o que isso significa
de fato?
-
Que, como a falha operacional é minha, fica facultado ao senhor a possibilidade
de escolher o dia que deseja morrer, ou melhor, as condições do dia em que
deseja morrer. Apenas deve ser no Rio de Janeiro, já que a data original era
para ser aqui.
-
Posso escolher a data em que vou morrer?
-
Não! Pode escolher as condições gerais no dia em deseja morrer. Tipo assim:
chuvoso ou com sol, dia de festa, feriado... essas coisas.
-
Posso escolher agora? – Disse com firmeza.
-
Pode sim, na verdade o senhor tem de escolher agora.
-
Um momento só... bebe algo? Vou pedir uma cerveja gelada.
-
Só tequila.
-
Jorge! – chamei o garçom – Traz duas Margaritas caprichadas!
A morte parecia inquieta e em um tom mais cavernoso ainda disse:
-
Decida-se agora!
-
Pensei um pouco – disse calmante – E gostaria de ser levado no dia em que não
tivesse nenhuma ocorrência de crimes ou assaltos no Rio de Janeiro e que todos os
ônibus da cidade tivessem ar condicionado. Essa condição está dentro do seu
protocolo?
A morte deu uma longa gargalhada. Virou-se para o garçom e gritou:
-
Jorge, traz a garrafa de Tequila, dois limões e sal. A conversa vai ser longa
mesmo.
Olhou para mim e pela primeira vez vi seus olhos vermelhos.
-
Senhor João, viver muito não é garantia de saúde... lembre-se disso.
-
Sim, eu sei estou me cuidando... então, está aceita a minha condição?
-
Sim, está. Mas, já que estamos conversando. O senhor já escolheu o seu
candidato? Veja só, estou em campanha pelo Bolsonaro... o senhor pode me ajudar
com o seu voto?