Por Prof. Msc. João Oliveira
Essa é uma daquelas histórias que, ouvimos ou lemos em algum lugar e, não
lembramos mais a fonte original. Peço desculpas por não ter a excelente
capacidade de memória do elefante que – segundo dizem por aí – jamais se
esquece de quem lhe deu um amendoim. A verdade é que não podemos deixar
que histórias como esta se percam por conta de nossa fraca capacidade de
retenção de conteúdo e, justamente por esta razão que, de tempos em tempos alguém
tem que, de novo, colocar no papel.
Havia uma pequena aldeia lá pelas redondezas de Lucerna na Suiça, próximo aos alpes, onde moravam os personagens deste antigo conto. No quarto da humilde construção um velho homem, doente, gemia de dor. O inverno rigoroso praticamente isolava a vila e a neve, com 20 centímetros de altura no solo, praticamente só permitia aos mais jovens e fortes se locomoverem durante o dia.
Na sala, a filha do velho homem ajeitava mais lenha na lareira para aquecer o
ambiente. A tuberculose estava tirando a vida daquele homem e respirar se
tornava um tremendo sacrifício de dor em agonia.
- Minha filha, minha filha... – suas palavras
mal saiam pela boca e o som se arrastava praticamente inaudível.
- Sim Papai, o que houve? Está com fome? –
Prestativa ela correu para próximo do velho que, deitado, nem ao menos se virou
para olhá-la de frente.
- Você pode ir à igreja do povoado me chamar um
Padre? - disse o velho.
- Pai? Não entendo o senhor, durante toda a vida
nunca foi nem me levou à igreja. Por que agora deseja ver um Padre? – perguntou
a menina.
- Filha... acho que está é minha última noite e,
por isto, preciso ver um Padre.
Atordoada com tal informação, mas movida pelo sentimento de tornar real o
provável último pedido de seu pai, a menina sai, noite à dentro, enfrenta o
frio e neve até a porta da Igreja. Lá chegando bate à porta com avidez:
- O que está acontecendo criança? Porque bate
tão nervosamente a minha porta? – Questionou o reverendo.
- É meu pai senhor Padre, ele disse que vai
morrer esta noite e que precisa ver o senhor...
- Minha doce criança, desde que sua mãe morreu
no parto ao te trazer ao mundo que rezo pela sua vinda à casa do Senhor, jamais
esperava que fosse nesta condições. Um minuto, vou pegar meu casaco. –
respondeu o Padre.
Acontece que Padres, assim como médicos, policiais e bombeiros, se chamados
vão. Mesmo sem saber direito do que se trata eles sempre vão.
Chegando no casebre de madeira o Padre se dirige direto ao quarto.
- Diga-me em que posso ser útil? – Questionou de
pronto o Padre.
- Padre, perdoe-me por nunca ter ido à sua
igreja e não permitir que minha filha fosse. Nunca acreditei em Deus e isto se
tornou mais forte quando ele levou minha esposa no dia do nascimento dela. – a
voz parava para permitir uma respiração mais forçada, as forças já deixavam o
homem a mercê da própria vontade - Mas, sabe Padre, acho que vou morrer esta
noite e... Gostaria de, pelo menos uma vez em minha vida, rezar... só que não
sei como fazer isto. O senhor pode me ensinar a rezar?
- Só isto? Você quer aprender a rezar? – Sorriu
o Padre.
- Faça o seguinte, está vendo aquela cadeira
vazia no canto do quarto? Pois bem, imagine que o Senhor Jesus veio lhe visitar
hoje. Converse com ele como quem fala com um amigo de infância que veio estar
contigo. Conte de suas dores, suas vitórias, peça desculpas por não ter dado
atenção aos chamados Dele antes... ou seja, diga tudo que sente com a
intimidade que só os amigos queridos podem compartilhar conosco.
- Mas... – balbuciou o homem – É só isso?
- Sim, rezar nada mais é do que conversar com
Cristo.
Pela manhã as batidas fortes acordaram o Padre que dormia na casa paroquial.
- O que foi menina, ainda não são seis horas e
hoje não tem missa matinal. – Queixou-se o Padre.
- É meu pai Padre, ele morreu! – Disse ela
afoita.
- Meus sentimentos minha filha. Mas é algo que
já esperávamos, porque este desespero então?
- A maneira como ele morreu... venha ver, é
muito estranho!
Os dois mais uma vez atravessam a pequena comunidade em meio a neve e
forte vento até que, no quarto, o Padre se depara com a seguinte cena: durante
a noite o velho havia se levantado e colocado a cadeira ao lado da cabeceira.
- Veja Padre – disse a menina – a cabeça dele
está na cadeira! Que posição estranha!
O Padre sorriu e disse:
- Quem dera que todos nós pudéssemos morrer
assim: com a cabeça no colo de Cristo.
Este não é um conto religioso, na verdade pode até ter sido mesmo verdade.
Trata-se apenas de uma reflexão sobre como lidamos com a fé. Aparentemente ela
surge, mais forte, quando já não temos forças.