Acordava toda madrugada com a mesma voz na cabeça: “-Vá para de baixo da ponte da Lapa. Lá, sua fortuna lhe aguarda!”. Essa voz perseguia há anos, ele não aguentava mais.
Morava ali mesmo, na rua Miguel Herédia (o número não posso revelar por motivos que ficaram claros mais a frente) ele, o cão e uma árvore. Sim, a árvore era parte da família, já que conversava com ela e regava todos os dias: um limoeiro!
O cão, de pobre nem latia, era magro de dó, e a vida só se manifestava no andar, quando estava acordado. Assim se vivia naquele humilde casebre de janelas quebradas. Eu disse que eram dois cômodos? Não? Pois bem, dois cômodos. Um era tudo, cozinha, quarto, sala o outro, o banheiro. Claro, hoje em dia isso tem até nome, mas naquela época a gente chamava de barraco mesmo!
E o sonho? Todas as noites o mandando ir para de baixo da ponte da Lapa, encontrar a sua fortuna? Bem, uma noite, a coisa foi muito grave, pois ele acordou e continuou ouvindo a voz. Foi tão forte que ele, finalmente, tomou a decisão: foi parar em baixo da ponte da Lapa.
E lá ficou, sentado, parado, olhando o rio Paraíba correr para São João da Barra. Nada de fortuna. Olhou nos cantos, bebeu do rio, tateou as colunas... nada!
Estava ficando tarde e duas preocupações vieram à mente: água para o limoeiro e comida para o cão. Tinha, portanto, de ir embora. Quando estava pulando a mureta da ponte, um homem, do outro lado da rua, o chamou:
- “Notei que o senhor passou o dia aí em baixo da ponte, está tudo bem? Fiquei preocupado pensando que pudesse se jogar... sei lá, o senhor não estava pescando...” - Disse o moço com ares de preocupado.
- “Não!” – respondeu nosso herói – “- Estou obedecendo a uma ordem que me veio em sonho, ir para de baixo da ponte da Lapa encontrar minha fortuna!”
Pronto! O homem caiu na gargalhada!
- “Mas que loucura é essa?” – disse se rindo todo - “Então você passa um dia inteiro de baixo da ponte por causa de um sonho? Amigo, você é muito doido! Veja só, eu tenho um sonho à anos. Ele se repete sempre, no sonho, eu estou na Rua Miguel Herédia , lá, nos fundos de um barraco - posso ver claramente no sonho - têm um pé de limoeiro, nas raiz desta árvore eu cavo e acho um pote cheio de moedas de ouro. O sonho é tão rico em detalhes, que tem um cachorro doente dormindo na entrada, eu passo e ele nem acorda, nesta casa pequena com os vidros das janelas quebrados.” – Ainda rindo prosseguiu – “- Agora vê só, se vou largar minha quitanda para ir atrás de um sonho. Amigo! Sonho é sonho...”
Nosso protagonista já não ouviu essa parte, estava correndo de volta à casa onde cavou a raiz do limoeiro e encontrou a tal fortuna. Ele vive bem hoje, o cachorro está gordo e saudável (obrigado por perguntar). Mas, e a moral da história? Toda história tem de ter um sentido maior.
Pois que assim seja, o dessa história é o seguinte: “Só conte os seus sonhos noturnos para um psicólogo, e durante uma sessão (para garantir o sigilo da interpretação), sabe-se lá onde está o limoeiro e onde dorme o cão?”
Um comentário:
Excelente orientação , obrigado João!
Ih, rimou, rs.
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