Endereços:

Instagram: @prospero.universo @dr.joao.oliveira.oficial Web: joaooliveira.com.br

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

A TEMPESTADE






Por João Oliveira

Os dois vizinhos moravam lado a lado no campo. Dois pequenos sítios com uma estrutura bem similar: casa, celeiro, moinho de vento, a plantação de feijão e muitos animais correndo pelo quintal. A vida era simples, porém muito agradável naquele lugar especial longe dos barulhos das grandes cidades.

Um dia, o homem que morava mais à esquerda viu, na linha do horizonte uma terrível tempestade se aproximando. Correu para avisar ao outro:

- Vizinho! Vizinho! Corre, tem uma grande tempestade se aproximando temos de proteger a plantação, os animais e o moinho...

O outro, que morava mais à direita, molhou o dedo indicador na boca, levantou a mão para o alto e depois de analisar com olhos algo no alto e invisível disse:

- Não se preocupe: o vento pode mudar!

- O que isso, está doido? Eu vou proteger o que tenho... acho que você deveria fazer o mesmo.

- Que nada – completou o vizinho limpando o dedo na camisa – Sempre fui um homem de muita sorte. O vento vai mudar, tenho certeza.

O homem que morava mais à esquerda não perdeu tempo. Saiu correndo e retirou as pás de vento do moinho, reuniu os animais no celeiro, cobriu boa parte da plantação e colocou madeiras em todas as janelas da casa. Não satisfeito subiu no telhado, desentupiu as calhas que estavam cheias de folhas e cobriu a chaminé.

Antes de entrar ainda foi mais uma vez na casa do vizinho da direita e disse:

- Tire, pelo menos, as pás de vento do moinho. A tempestade vem forte e vai tombar a torre do seu cata-vento.

- Que nada! – Replicou rindo o outro que já estava relaxando em sua rede na varanda – Sou um homem de muita sorte e sei que o vento vai mudar de direção a qualquer momento. A tempestade vai passar longe de nós.

O homem cuidadoso desistiu, entrou em casa e fechou todas as portas e janelas. Ficou quieto no quarto com o rádio ligado acompanhando as notícias da forte tempestade que já fazia vítimas em seu caminho.

As horas se passaram e, de fato, o incrível ocorreu: o vento mudou. A tempestade tinha mudado de rumo e não passaria por sobre as propriedades desses dois vizinhos. O tempo já estava limpo, mas, a noite havia chegado e, por conta de todo trabalho que teve se preparando para a tormenta, o vizinho da esquerda adormeceu com o rádio ligado.

Como o rádio estava tocando músicas, todas as portas e janelas estavam fechadas e ele ainda havia colocado madeiras reforçando as janelas não pôde ver ou ouvir nada do que se sucedeu durante a madrugada do lado de fora: a casa de seu vizinho – da direita – pegou fogo. As chamas começaram quando uma vaca, assustada com relâmpagos ao longe, tombou um lampião no celeiro. O fogo se espalhou por quase toda propriedade, transformando a bela casa, o moinho e o próprio celeiro em poucas brasas retorcidas.

Ao amanhecer o vizinho da esquerda acorda assustado com batidas fortes em sua porta principal. Quando abriu teve um grande susto, o seu amigo estava todo chamuscado, com a roupa rasgada e sujo de carvão.

- O que houve? – Perguntou ele assustado.

- A sorte é como o vento amigo – respondeu triste o vizinho da direita – também pode mudar.

Assim, para termos alguma garantia que algo vai dar certo é necessário nos prepararmos antecipadamente. Não é certo que tudo vai correr bem. Pode ser, inclusive, que o esforço do preparo não seja realmente necessário. Mas, ao contrário, quem deixa sempre as coisas acontecerem contando com a sorte, com certeza terá uma menor probabilidade de sucesso. Lembre-se que o preparo, muitas vezes, é apenas moldar uma boa estrutura emocional para enfrentar as tempestades da vida.

Quer se preparar melhor?

http://asetimachave.com.br

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

EU SABIA QUE VOCÊ MENTIA


Por João Oliveira

            
Espero que esse bilhete seja lido em um bom momento e que não lhe cause nenhum tipo de transtorno. Escrevo enquanto observo você e o seu jeito de ser. A sua linguagem não verbal é muito rica e por isso resolvi deixar por escrito tudo que consegui captar de você.

Você sempre é muito animado em suas conversas, seus movimentos as mãos e os braços, essa sua forma toda particular de colocar as palavras no ar, como se as mãos fossem parte de um vocabulário especial, esse é o seu charme secreto. Mas, só quem te conhece bem sabe que isto é parte de um esquematizado jogo de conquista. Hoje, isto não ocorreu.

Quando você estava narrando o seu dia, falando sobre o trabalho, seu corpo estava inclinado para à frente e suas mãos mostravam as palmas na minha direção. No entanto, quando eu comecei a falar sobre a sua nova funcionária seu corpo se recolheu e suas mãos se fecharam. Você encostou as costas na poltrona de tal jeito que ela chegou a afundar um pouco, parecia que sua intenção era sair da sala através de um buraco no sofá.

Eu insisti. Você cruzou os braços na frente do tórax, primeiro no alto, próximo ao osso esterno, isto (eu bem sei) significa que existia um desafio. Quando eu disse que sabia de tudo, que você estava tendo um relacionamento com ela, seus braços, ainda cruzados, abaixaram e ficaram na direção do abdômen. Sabe o que isso significa? Medo meu querido!

Sim, foi naquele instante eu tive a certeza que você mentia o tempo todo para mim. Você estava com medo. Deixa eu lhe explicar caso você desconheça: quando colocamos os braços cruzados abaixo do osso esterno, que cobre o peito, é um sinal claro que buscamos proteger uma área que, anatomicamente, não tem grandes proteções. Isto é da própria evolução natural da espécie humana! Não temos controle consciente sobre estes movimentos, são assim quase automáticos, compulsórios!

Claro que, você pode argumentar que isto é circunstancial e que pode ter ocorrido uma grande coincidência. Sim, porém, nas repostas que você dava ao meu inquérito, uma estranha coceira se apossou do seu rosto, lembra-se disto pelo menos?

Sabe, uma das coisas que sempre gostei na sua personalidade é esta sua sede de saber, por isto não me custa explicar por que ocorre esta sensação incômoda no rosto e pescoço. Quando uma pessoa mente, sabendo que esta mentira pode causar dano se descoberta, o sistema endócrino reage para uma possível situação de luta ou fuga e aumenta a pressão arterial fazendo o sangue fluir mais rapidamente. Os vasos periféricos da face são irrigados em grande velocidade e, este movimento faz surgir uma coceira real no nariz, canto da boca, olhos e pescoço. O corpo sempre vai delatar uma situação de estresse nessas circunstâncias muitas vezes com uma vermelhidão no rosto.

Preste atenção, não houve confissão expressa verbalmente, tudo foi inconsciente. Não se sinta culpado, embora seja. Como, por exemplo, a sua respiração lentificada. Quase não dava para notar se você estava vivo ou não, o ombro nem mexia, subindo e descendo como ocorre com todas as pessoas em estado de calma e tranquilidade. Ao final, com o estresse gerado pela nossa conversa, sua respiração estava rápida e curta: uma prova de nervosismo; assim como as piscadas dos seus olhos: mais rápidas que o normal. Não há como escapar de tantas evidências, você mentia sim e eu sabia disso o tempo todo, apenas me controlei.

Agora, tenho outra prova mais contundente ainda de sua elaboração fictícia, de sua estratégia falha de me enganar: seus olhos! Sim, meu amor, os seus olhos!

Todas às vezes que você respondia uma pergunta minha relacionada a ela, os seus olhos se movimentavam para o alto da testa do lado direito. Sendo você destro, é neste lado do cérebro que está o mecanismo da imaginação, então, todas suas falas, nestes momentos, eram criadas, imaginadas: pura mentira!

Mais uma coisa que eu quase me esqueço de falar: os seus lábios. Eles também me disseram mais que as palavras. Uma pessoa normal, destra, falando sem pressão ou emoção tende a movimentar mais o lado direito dos lábios, isto porque a região de Broca e área Wernicke, responsáveis pela movimentação motora e compreensão da fala, estão do lado esquerdo do cérebro. Você sabe que o lado esquerdo do cérebro movimenta o lado contrário do corpo, pois bem, no momento em que a emoção domina o orador este movimento mula de lado! Não é impressionante? Ah! Mas, impressionante mesmo foi ver seus lábios “sambarem” diante dos meus olhos.

Tenho de ir embora, não vou te ocupar mais falando sobre algo que já está claro. Neste momento os meus próprios pés apontam para a porta de nosso apartamento, por onde eu sairei e nunca mais voltarei. Meus pés estão tais quais os seus durante a nossa conversa, apontando para a porta. Isto também é um movimento inconsciente de quem deseja fugir de uma situação, afinal, os pés sempre apontam para a área de interesse e foi, justamente, por observar seus pés apontando para ela na festa da empresa, que eu decidi estudar mais sobre análise comportamental.

Tenha uma boa vida, a minha será!

GOSTOU?
Quer saber mais sobre esse assunto?

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

CENA DO CRIME




Por João Oliveira


Quando olhou para o sofá percebeu que o corpo estava do lado esquerdo e que, só não havia tombado ao chão, por ter ficado escorado no braço de veludo muito mais alto que os normais. O prato de comida, na mesa de centro em frente a televisão, revelava que ele não havia terminado a refeição, estava pela metade. Apenas um orifício de entrada do projétil, do lado direito da têmpora, sem saída visível, isto regulava com o perfil de uma bala de pequeno calibre: possivelmente ainda dentro da cabeça da vítima.



- “O senhor viu que a arma está no sofá, do lado do corpo? ” – disse o policial –“Nós não mexemos em nada. Está no mesmo lugar, próximo da mão direita dele. Como a arma é pequena não houve muito coice e caiu aí mesmo perto do corpo. ”



-“Claro, claro...” – O investigador continuou andando pela casa. Na cozinha americana encontrou um prato no escorredor junto a talheres limpos. Voltou ao local do corpo e agora olhou com mais cautela o prato que estava sobre a pequena mesa em frente ao provável suicida.



- “Estranho, quem planeja cometer suicídio não prepara um jantar...” Falou sozinho.



- “Precisamos fechar as informações. ” – falou apressado outro policial – “Fechamos com suicídio? ”



- “Não se trata disto, temos um caso de homicídio aqui. Mas, podemos encontrar o principal suspeito sem sairmos desse andar.” – sorriu de forma estranha o investigador.



-“Como você pode afirmar isto sem ao menos termos um papiloscopista aqui conosco? Você agora vê digitais com seu olho biônico? ” – brincou outro policial que também acompanhava o desenrolar da cena.



-“Não é isto, veja aqui: a vítima deixou a comida do lado direito do prato e os dois talheres estão do lado esquerdo, isto indica que ele era canhoto. Assim, ele não poderia ter atirado com na têmpora direita. ” – continuou – “Veja, o lado do rosto esquerdo dele é maior que o direito, isto só reforça esta possibilidade. E mais, o assassino não está longe. ”



-“E como você pode saber disto? ” – perguntou o mesmo policial.



-“A pessoa que atirou nele estava jantando aqui e, após o tiro, para ocultar seu rastro, teve tempo de lavar o prato que comeu e os talheres, que estão secando na pia da cozinha. ” – e completou – “Só uma pessoa com facilidade total de acesso a esse apartamento teria calma e tempo para fazer isso sem dificuldade. Como o porteiro afirma que ninguém estranho passou pela portaria esta noite ele só pode estar nesse prédio e, muito provavelmente, nesse mesmo andar. ”



- “Só falta você saber também o motivo...”



- “Crime passional! Foi uma mulher! ”



-“Como????” – Falou espantado o policial



- “Cheiro do prato que está secando, a pessoa usou um desinfetante de limão. Você vê algum vidro aqui? ” – mexendo na prateleira da cozinha – “Ache o recipiente deste desinfetante que achará a assassina. Nenhum homem teria este cuidado, este tipo de detergente é especial para não causar danos às mãos. É algo muito refinado e caro! ”



- “Interessante, como é o nome desta técnica que o senhor usa para analisar cenas de crimes? ”



- “Análise Comportamental amigo, os homens sempre se expõem, mais do que desejam, pelo modo de agir. Não há segredos quando você sabe onde olhar. ”



Naquela noite uma série de entrevista revelou que uma das moradoras havia abandonado a cidade, tornando-se assim a suspeita número um do crime. Uma vistoria autorizada em seu apartamento revelou que ela realmente tinha um estoque de detergente de limão na cozinha e que, pelos e-mails descobertos em seu computador, mantinha um secreto romance com a vítima.



O caso estava praticamente encerrado.