O QUE VALE NO VALE, VALE AQUI?
Por João Oliveira
O Vale do Silício não é um território demarcado no mapa com linhas precisas. Ocupa, na Califórnia, uma área que começa no sul da baia de São Francisco e inclui muitas cidades como: Redwood City, Menlo Park, Palo Alto, Los Altos, Mountain View, Sunnyvale, Cupertino, Santa Clara e San Jose. Nelas estão as maiores (e mais prósperas) empresas desta era de inovação digital. O aparente centro gravitacional de tudo isso é a Universidade de Stanford em Palo Alto.
Com uma abundância de jovens talentos com ideias disruptivas, lá existe um cultura organizacional, aparentemente única. Se isso é um fato que pode ser transformado em um protocolo de ação, porque o mesmo sucesso não ocorre em outras áreas no mundo?
Não é por falta de tentativas. Muitas cidades criaram modelos semelhantes com incentivos a startups de tecnologia, mas o resultado ficou longe de ser igual. Segundo o Global Startup Ecosystem Report 2019, elaborado pela Startup Genome, o perfil de hoje coloca o Vale em primeiro lugar seguido, de muito longe, por New York, Londres, Pequim, Boston, Tel Aviv e Los Angeles. São Paulo aparece na lista como um ecossistema promissor, mas, em uma posição distante dos demais.
Todos os indicadores incluindo o número em empresas e resultado financeiro do Vale do Silício destoam de forma significativa de quaisquer outras áreas que, teoricamente, competem pelo primeiro lugar em agrupamento de startups de tecnologia. Pelo que se pode notar, mesmo que seja replicado as mesmas condições de apoio técnico e financeiro, por parte governamental, o resultado não se repete.
O segredo do que se observa hoje, como sucesso alcançado, faz parte de uma cultura organizacional impossível de ser transcrita como um protocolo de uma única empresa, pois, é a própria estrutura mental do Vale. Podemos tentar desmembrar em alguns itens:
1 – Qualquer ideia deve ser validada: Em uma reunião em 14 de junho/2019 na The Vault, em São Francisco (CA-EUA) com Fernando Figueiredo, brasileiro que é co-founder e CEO da OAKTECH, empresa de estratégia global e internacionalização, ficou claro que a cultura aceita qualquer ideia nova desde que possa ser validada. Um exemplo disso é LiLou, o porquinho terapêutico do Aeroporto de São Francisco. Alguém teve a coragem de apresentar um projeto que afirmava a importância de um porco circulando pelo aeroporto para acalmar os passageiros nervosos e, o gestor, teve a coragem de colocar essa ideia em prática para ser validada. Hoje é um sucesso!
2 – Desenvolvimento de grupos para trocas de ideias: Laís de Oliveira, brasileira que desponta como Diretora de Desenvolvimento de Comunidades na Startup Genome (essa mesma que faz o levantamento dos ecossistemas de startups) com sede em São Francisco nos fala da importância da criação de grupos com origens diversas. As comunidades podem, pela sua miscigenação, gerar ideias novas, parcerias produtivas e, além de tudo, financiamentos mútuos. Os projetos podem se intercambiar – sinergia – gerando desafios impossíveis de serem alcançados por uma só pessoa: parceira é tudo nesse ambiente.
3 – Para ter abundância deve-se compartilhar: Bruno Solis, da Kong Inc. hoje executivo de contas para América Latina com sólida experiência em vendas de sucesso, fala com orgulho dos mais de 600 mil usuários de seu sistema que não pagam um centavo sequer. No entanto, o faturamento da Kong é de vários milhões de dólares. Sua base é oferecer plataformas de código aberto e serviços em nuvem para quem deseja gerenciar, monitorar e escalar Interface de Programação de Aplicativos e Microservices. A base do pensamento é que, quando você distribui, o mercado pagador retorna aceitando o preço da credibilidade alcançada.
4 – O talento deve ser valorizado: Vinícius Depizzol, brasileiro do estado do Espirito Santo, um dos principais Designers no escritório da Microsoft Corporation na Market St em São Francisco disse que hoje, no cultura do vale, há um grande cuidado da empresa em manter seus colaboradores o mais seguros e confortáveis possível. Não é o horário de saída ou entrada no prédio da empresa que vai trazer a solução da demanda. Muitos colaboradores passam mais tempo trabalhando em casa do que na empresa e, com responsabilidade e engajamento, apresentam os resultados em seus devidos prazos.
5 – Não dispensar o passado por conta do futuro: Com Martin Spier, arquiteto de performance da Netflix, numa conversa no Steins Beer Garden em Cupertino, CA – EUA, sobre cultura organizacional e a liberdade que deve ser colocada à disposição dos colaboradores, foi ressaltado algo muito interessante: a Netflix ainda entrega DVDs mensalmente a milhões de usuários. Como uma empresa que é líder mundial em streaming ainda carrega esse peso? A resposta foi direta: é um mercado de milhões de dólares. Embora a tecnologia esteja à disposição muitas pessoas, por motivos quaisquer, preferem o velho DVD. A Netflix, que começou dessa forma, não abre mão desses clientes e mantém toda estrutura para atendê-los, mesmo que o retorno não seja o mesmo do modelo atual.
6 – Pensar diferente sempre - A consultora sobre o ecossistema do Vale, Mariangela Smania, quando conduz o seu treinamento “Path to Innovation” pelo campus da Universidade de Stanford reforça a estrutura valiosa do Design Thinking: olhar o todo e os detalhes para inovar. Não basta apenas saber a necessidade e ter a solução, muitas pessoas desenvolveram produtos e serviços fantásticos que não tiveram êxito ou foram ultrapassados rapidamente pela concorrência. O pensamento disruptivo é um talento, mas pode e deve ser replicado com a utilização de técnicas apropriadas.
São apenas alguns pontos que podemos extrair da cultura reinante no Vale que, pelo que vemos, apresenta resultados. Este texto trata-se de um pequeno resumo das principais ideias que nos foi possível colher no mês de junho de 2019 quando estivemos imersos nesse ambiente do Vale do Silício.
Não é a chave do segredo, mas é uma porta importante que vem dando resultados significativos na inovação de grandes e pequenas empresas.
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