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quinta-feira, 19 de março de 2015

Tirando uma vida






Por João Oliveira

Era primeira noite de lua nova, por isso a fogueira estava maior e iluminava até o alto das árvores que circundavam a aldeia. Todos os homens estavam sentados em volta e mantinham o homem branco amarrado pelos pés e mãos. Esperavam a presença do pajé para decidir o que fazer com ele. Afinal, ele tinha descoberto o maior de todos os segredos deles.

O pajé sai da tenda exibindo seu manto colorido, ele era tido por todos como muito poderoso porque era albino, não tinha pigmentação na pele, por isso destacava sua presença no manto da noite. Sentou-se em frente ao grupo:

- Ele viu em funcionamento? – perguntou altivo.

- Sim! Quando estávamos levando peixes para Tikal.

O pajé se voltou para o homem que estava amarrado e perguntou:

- Diga-me homem branco, o que viu?

- Nada...

- Então não viu uma grande tigela de ouro vibrando com um homem dentro a guiando sobre as pedras em direção a Tikal?

- Bom, falando assim... é vi sim.

- O que pensou sobre isso?

- Muito ouro para servir apenas de meio de transporte. Para isso temos carroças e cavalos.

O pajé olhos para os lados e voltou a questionar.

- Temos cavalos aqui?

- É verdade – falou o prisioneiro – Na verdade nem roda ou carroças eu vi. Só muito ouro mesmo.

- Sabe que não podemos deixar você ir embora com essa informação. Outros, como você, viriam roubar nosso ouro.

- E o que pretende fazer comigo? Vai me matar?

- Não! – disse o pajé – vamos tirar essa vida!

Dito isso começou uma grande cantoria na aldeia, mulheres vieram com jarros cheios de um suco feito de ervas e cipós da selva. Os homens agarraram o prisioneiro e o fizeram beber grande quantidade de tal liquido. Tonto, embebedado pela fórmula selvagem, ele caiu em sono profundo.

- E agora pajé, o que fazemos? – Um jovem que nunca havia presenciado tal ritual perguntou assustado.

- Amanhã ele será um de nós! Essa vida que vocês viram hoje jamais voltará a existir. Ele acordará sem memória. Digam que caiu de uma árvore e bateu com a cabeça, não saberá nada a respeito dele mesmo ou de toda sua história de vida. Caberá a nós ensiná-lo como ser um membro de nossa comunidade. Ele será querido e amado por todos nessa nova vida que se iniciará amanhã ao nascer do sol. Que seja bem vindo mais um novo filho do sol!

E assim aconteceu. Pela manhã o homem branco estava imerso na mais completa amnésia. O líquido havia deletado todas as informações de seu cérebro. Mal conseguia falar e, todos da tribo, dedicaram muito tempo a ele com amor e carinho. Por ser branco ele poderia em algum tempo futuro se tornar (quem sabe?) o novo pajé da tribo.

Ocorre que nossas vidas nada mais são do que resultado de nossas memórias. Todas as vezes que temos de tomar alguma decisão, por menor que seja, o cérebro faz uma rápida busca nas experiências passadas para poder tomar a melhor decisão possível no momento. Caso tenhamos um pacote de resultados negativos ou traumáticos em eventos similares, é possível que exista alguma reação emocional de afastamento em uma nova experiência.

Agora vem o detalhe importante: o cérebro não faz muita distinção entre fatos verdadeiramente ocorridos e os que podemos simplesmente criar em nossa imaginação. Após uma experiência vivida o fato vira memória, mesmo lugar onde estará um cenário criado pela imaginação. Assim, se sua mente estiver cheia de construções positivas serão essas as referências que sua mente terá para auxiliar na tomada de novas decisões.

Escolha muito bem o conteúdo que vive em sua cabeça. Tornar hábito ressignificar fatos ruins do passado é mais salutar do que viver relembrando derrotas. Pare de falar dos problemas isso irá consolidar em sua estrutura mental um padrão negativista. Seja feliz antes na sua imaginação que isso irá se propagar, acredite, pelo ambiente real.


sábado, 14 de março de 2015

O SALTO PARA A MORTE



Por João Oliveira

                Sei que se recordam que deixamos o nosso protagonista a ponto de saltar do precipício quando descobriu que o pai dele era um mago que se fazia passar por rei. Voltamos ao ponto em que os dois discutem o motivo pelo qual o pai (rei/mago) havia criado todas as ilusões em sua vida (príncipe/plebeu). Caso não esteja entendendo essa narrativa é porque está tudo certo, continue.

                Fala o filho enquanto balança o corpo bem próximo a beirada da montanha: - “Pai! Não posso viver com isso. Porque me criastes dentro de uma ilusão? Por me ocultas-te a existência da pobreza e dificuldades do mundo?”

                O pai, simples comerciante de secos e molhados na cidade de Ur, mas poderoso mago na manipulação da realidade, disse sem levantar a cabeça: - “Porque eu te amo filho. Foi por amor que te criei dentro de uma ilusão.”

                Volta a voz do rapaz a ecoar no abismo: - “Amor? Que tipo de amor é esse que coloca um véu sobre a realidade e oculta o que de importante existe na vida?”

                O pai, que (não se esqueça disso) fingia ser rei explica: - “Filho, não há nada que se possa aprender com a pobreza e o sofrimento. Eu te poupei dessas coisas porque eu mesmo sofri muito na minha vida. Sabe filho, os pais sempre querem o melhor para os filhos. Criei tudo ao seu redor com minha magia para evitar o seu contato com o sofrimento dos homens para que você pudesse se desenvolver mais feliz e pudesse ser um homem sem nenhuma mágoa ou angústia em seu coração. Fiz isso porque te amo.”

                Quase soltando o corpo no ar, o jovem olha triste para o pai e pergunta: - “Pai, e porque não me permitiu estudar outras religiões, outros conhecimentos ou mesmo viajar?”

                A fala retorna ao pai: - “Porque te amo filho, já disse. Veja, o conflito que pode ser gerado na cabeça de alguém com muita informação é horrível. Pessoas ficam confusas diante de opções. Eu simplifiquei tudo para você te apresentando a religião que conhecia, transferindo o meu conhecimento do comércio e te mantendo seguro aqui, onde eu posso lhe dar toda proteção. Viajar é perigoso, as estradas possuem ladrões, curvas perigosas e mares revoltos. Fiz para te proteger, porque te amo filho.”

                O rapaz, olha para o pai com enorme tristeza estampada na face e diz: - “Por causa disso não sei o que é falso ou real. Não estou preparado para viver nesse mundo cheio de opções e diferenças. Vou me jogar neste precipício!”

                O pai vendo que o filho estava realmente decidido a pular do penhasco faz uma magia e a morte se apresenta diante do antigo príncipe: - “Busca-me senhor? Aqui estou, abraça-me e vamos para o meu silencioso mundo sem escolhas.”

                Sabe, a morte tem cheiro. Exala calor. A morte possui uma voz grave, um pouco gutural. Faz surgir em nós sentimentos e emoções que só teremos diante da própria e, nesse exato momento (mesmo sabendo que era fruto da magia do pai), o rapaz ressignifica suas questões internas e diz: - “Pai, acho que posso viver com isso.”

                O pai finalmente se levanta e fala sorridente: - “Que bom meu filho! Então a partir de agora você também se torna um mago como eu. E, de magia e realidade, vivemos em um mundo imperfeito onde ninguém tem certeza de estar totalmente certo ou absolutamente errado.”

                E continua sua fala: - “Eu errei querendo acertar. Ao te proteger demais criei a fraqueza em você. Agora, tenho o dever de desvelar tudo quanto puder do mundo.”

                O jovem, já voltando em direção ao pai fala e tom baixo: - “Sinto muito, seu tempo de mestre já se foi. Acabou a aula pai. Bem ou mal formado é meu dever desbravar a realidade que está sob o sol. Obrigado por reconhecer seu erro, mas nossas vidas seguem rumos diferentes agora.”

                Dito isso, o nosso protagonista pega uma pequena mochila e caminha para fora da cidade de Ur. Aos poucos ele desaparece no horizonte sem ao menos saber o que existe após as montanhas.

                Esse texto é uma rudimentar adaptação de outro mais longo cujo o verdadeiro autor se tornou desconhecido com o passar dos séculos. Trata de algo simples e fácil de entender: não devemos dar o que nos faltou e, nem obstruir o que não entendemos.

                Os filhos e as pessoas que estão sob a nossa guarda e proteção possuem destinos próprios que serão construídos pelos seus erros e acertos. Querer direcionar um futuro mais adequado baseado em nossa própria história de vida é o mesmo que amarrar asas de um pássaro e depois querer que ele consiga voar.


                Tente olhar para si mesmo e descobrir quais são as coisas que subtrai da vida das pessoas e o quanto de sua magia está usando para construir outra realidade. Pode ser que isso seja a âncora que aprisiona navios cheios de cargas que podem mudar o mundo.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Máscara de seda



 Por João Oliveira
               
                Administrar as emoções é algo que demanda muita atenção e paciência consigo mesmo. Somente aqueles que conseguem se tornar mestres na observação de si mesmo podem se orgulhar de saber o momento certo de mudar o rumo dos atos comportamentais, justamente por perceberem uma emoção perigosa em curso.

                É possível, caso queira, se transformar em uma pessoa que entende o próprio processo emocional. Primeiro responda sim ou não aos seis questionamentos abaixo:

1)   Já perdeu o controle emocional alguma vez em sua vida? 
 
2)   Para você é impossível sair de uma discussão que sabe que está perdendo?

3)     Nunca sorri para as pessoas que realmente não gosta?

4)    Já chorou, publicamente, porque as pessoas não lhe trataram com o devido respeito?

5)     Já agiu de forma violenta por ter sido contrariado seriamente?

6)     Já perdeu oportunidades na vida por não conseguir se controlar emocionalmente?

Parabéns se todas as respostas foram “não” você consegue manter o autocontrole em momentos críticos da sua vida. Caso tenha respondido afirmativamente até três perguntas, você deve se esforçar mais para chegar ao autogerenciamento, pois já conhece o caminho. Mas, se você respondeu “sim” para todas as questões colocadas, preste bastante atenção neste pequeno texto.

Um treinamento de análise comportamental é sempre bem-vindo para se aprimorar a capacidade de interpretar as emoções das outras pessoas. Se isso não é possível, siga algumas dicas que podem ser úteis no seu dia a dia.

1 – Respiração sempre que necessário. Quando perceber que está ficando alterado, inspire profundamente, prenda a respiração contando até quatro e, expire da forma mais lenta possível. Isso poderá ajudar a manter o controle emocional.

2 – Postura antes do contato. Quando estiver próximo a ter contato com pessoas que podem alterar o seu estado emocional faça antes, por dois minutos, algumas posturas que podem alterar o seu estado de ânimo: pose do super-homem, pose do general (mãos unidas nas costas) e mãos colocadas unidas atrás da cabeça. Isso dará resultado, acredite.

3 – Olhar atento. Sempre busque pistas na face das pessoas do estado emocional reinante. A postura do corpo, posição da cabeça em relação ao tronco, tudo isso pode lhe dar informações de como sua conversa está indo e, caso você perceba algo errado, pode mudar a linha de abordagem antes de um colapso comunicacional.


Claro que esse texto não pretende resolver a questão de uma só vez. Serve mais como um alerta para as pessoas que querem melhorar seus relacionamentos. Tentar dominar as emoções sem ao menos prestar atenção nelas é o mesmo que ir a uma festa de fantasias usando uma máscara de seda: todos irão saber quem você é realmente.