Por João Oliveira
Provavelmente não existiriam algarismos suficientes no mundo se alguém quisesse escrever o número exato de anos de existência do castelo. Ele sempre existiu. O tamanho também era outro mistério pois, parecia aumentar quando uma tempestade noturna recheava a madrugada com seus trovões e, sempre, quando isso ocorria, uma de suas centenas de portas amanhecia aberta.
Posso explicar melhor essa situação estranha: algo, ou alguma coisa, saía do castelo após uma tormenta de raios.
Devo também alertar que essa história se passa em um lugar no futuro que aconteceu há muito tempo atrás e que as todas as pessoas, que moravam nas aldeias próximas ao castelo das mil portas, eram muito afetadas pelas notícias de novas portas abertas.
Lembro de um dia, logo cedo pela manhã, quando um habitante de umas das aldeias chegou assustado trazendo a notícia que uma porta havia amanhecido aberta. Todos ficaram muito apreensivos imaginando o que de lá teria emergido:
- Com certeza é um monstro que vai devorar nossas galinhas.
- Pode ser pior – disse outro – E se for a própria morte que vem nos pegar durante a noite?
Foram dias perturbadores até que todos novamente tomassem suas rotinas no campo novamente. Embora, posso lhe confessar, nunca mais foram os mesmos e sempre que algo estranho e desconhecido ocorria em suas vidas eles facilmente se assustavam.
Em outra ocasião, foi uma criança que trouxe o alerta, logo após uma noite de tormenta, que uma nova porta havia sido aberta no castelo. Nesse dia a surpresa causou comoção positiva, afinal, estava um dia de sol tão bonito que só poderia ter saído algo bom do castelo:
- Será que é um anjo que veio nos trazer suas bênçãos?
- Pode ser que seja a própria sorte que saiu para andar entre nós: sinal de boa colheita este ano.
Passados uns quinze dias, nada de fato grandioso ocorreu, e a vida seguiu seu rumo costumeiro. Mas, de fato, eles se tornaram mais alegres deste dia em diante.
Estranho foi quando o senhorio da vila próxima ao rio chegou a cavalo alardeando que uma porta enorme havia amanhecido aberta. As pessoas ficaram indignadas com a notícia e demonstraram isso com aspereza:
- Essas portas também vivem abrindo e de lá nada de fato sai. Nada de útil para nós.
- Devíamos é tocar fogo nesse castelo inútil.
Claro, que, como pode imaginar, em poucas semanas a rotina absorveu esses pensamentos e, de resto, posso afirmar que eles (até hoje) ainda se irritam com algo que os incomoda.
É possível que você já tenha percebido que, nessa curta metáfora, foram as emoções que surgiram após as diferentes tempestades. E, se possui uma imaginação fértil, já fez a conexão entre o castelo e as pessoas que mantém os corações com suas portas fechadas.
Não há como aprisionar as emoções. Elas foram criadas para serem vivenciadas e, com o tempo certo, cada uma delas irá se tornar parte da memória. Boa ou má, a emoção será internalizada e se tornará parte do que somos e sempre seremos.
Manter as portas do coração fechadas até que uma tempestade as abra fazendo surgir uma forte emoção não é o melhor que podemos fazer. É lógico também pensar que ninguém possui as chaves para entrar e sair quando quiser e, é certo que, alguns arrombamentos e explosões irão ocorrer. No entanto, é justamente isso que nos faz humanos: sermos capazes de vivenciar e superar mesmo as emoções negativas mais marcantes em nossas vidas.
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