O
sofrimento no luto pela perda, seja ela real ou imaginária, pode corroer um ser
humano e não existem regras
estabelecidas que fechem janelas temporais limitando a vivência deste
sentimento. Sabemos que as pessoas podem manifestar sintomas diversos que vão
do choque, negação, raiva, depressão à aceitação. Durante ou após essas fases, podem ainda surgir:
culpa, angústia, baixa autoestima e a revolta, que muitas vezes não encontra objeto
no mundo real e, então, recai contra o próprio sujeito que sofre.
Onde
está o parâmetro para o tamanho que se deve sentir ou por quanto tempo devemos
sofrer pela perda do outro?
Uma
vez um monge hinduísta perdeu sua Japamala após uma cerimônia. Ele ficou transtornado com
a perda e, muito nervoso, pedia a todos que o ajudassem a encontrar o objeto
religioso. Após uma busca insana, de quase duas horas o cordão de contas
finalmente foi encontrado, neste instante ele explodiu de felicidade e comemoração.
Marajaha Chandra Mukha Swami, personalidade respeitada no universo védico, que assistia
à tudo, não se conformou: “ – Como pode estar tão alegre em encontrar algo que
já era seu? Antes de perdê-lo estava em suas
mãos, todo o tempo, e você mal percebia este objeto.”
As
pessoas que estão ao nosso lado hoje podem não estar recebendo merecida e real
atenção. A falta, que é imposta pelas
obrigações diárias, nos limitam o convívio de quem gostamos. Acredito, e posso
estar errado nisto, que a revolta que surge, após uma perda irreparável, se dá
pela possível culpa de não ter vivenciado o máximo possível da presença deste
alguém em vida.
Após
a progressão total no processo de vida, fato que também chamamos de morte, ainda
existe a possibilidade de encontros nos sonhos. Salve-me Carl G. Jung, pois são
todos mesmo de compensação? Ou algo existe além da porta de saída? Não convém o
debate, pois crenças e fé são de âmbito particular e o respeito à
individualidade está acima de tudo. O alívio ocorre em campos oníricos.
No
entanto, podemos elaborar mais a respeito enquanto existe a oportunidade de
compartilhar tais momentos, quanto mais exaltarmos, o que nos é prazeroso em
companhia, menos devemos nos culpar após sua partida. Não creio que seja uma
fórmula matemática e nem a solução para quem sofre, mas podemos contar como uma
justificativa para o entendimento.
Partiu,
é fato! No entanto vivemos intensamente! Uma regra simples: dar valor ao que se
têm enquanto possui, embora isto, provavelmente, não irá apagar o sofrimento,
mas pode amenizar o peso na consciência, pois foi feito de tudo para aproveitar
os momentos juntos. Pode ser uma possibilidade que isto venha evitar o
surgimento da culpa e posterior revolta. Funcionaria como um anteparo de
segurança à dor maior.
Outro
dia uma pessoa me disse que foi a uma festa de inauguração de um “Box Blindex de Banheiro”. Não entendi do que ela estava falando e a
explicação é que era apenas um motivo para as amigas de encontrarem no
apartamento de uma delas numa festa temática onde, todas deveriam ir de roupões
e toucas na cabeça: celebração à vida, só isso! Um ótimo exemplo que não é
necessário nenhum evento especial para a demonstração de afeto e carinho. Não é
preciso esperar o dia dos pais, das mães, dos filhos... Existe dos irmãos? A
linha de afeto deve ser clara e transparente, repetidas vezes anunciada e, caso
não escute o eco do carinho, repita mais uma vez. Dar afeto nunca é demais,
alias é a única coisa que quanto mais se dá mais cresce dentro da gente.
Então
o luto pode ser maior ou menor. Não é o outro, que parte, a ditar o tamanho daquilo
que sentiremos em sua ausência, pode ser o peso faltoso das palavras que pretendíamos
lhe entregar e não houve suficiente tempo. E, ainda, podemos pensar, se este tempo era de
qualidade ou apenas quantidade. Pois, se for de qualidade, o último segundo
valeu por toda vida.