Por Prof. Msc. João Oliveira
Existe
quem diga que a raiva é a pior emoção. Já debatemos sobre isto em outros textos
e, alguns pesquisadores também concordam que, se bem direcionada a raiva
funciona como combustível de foguete na obtenção de resultados. Também não
creio que a tristeza seja a pior emoção, afinal nenhuma emoção natural (são
seis) é ruim, todas estão a serviço da manutenção da espécie humana. Algumas
perderam um pouco o sentido e são, em nossa sociedade, camufladas para não
demonstrarem nossas fragilidades (tristeza e medo), outras surgiram e se
tornam, a cada dia, mais universais (desprezo e desdenho). A verdade é que, a
meu ver, a pior emoção foi igualmente desenvolvida no caminhar da espécie e se
chama, em nossa língua: indiferença.
O
ódio sentimento forte e enraizado é diferente da raiva, emoção passageira. Por
pior que seja, o ódio tem objeto, ou seja, reconhece algo ou alguém que é foco
de sua atenção. É possível, inclusive com certa facilidade, reverter este
sentimento caso o tal objeto faça algum esforço neste sentido. Exemplo, você
mantém esse sentimento por alguém anos seguidos, um dia essa pessoa se reúne
com você, pede perdão, se desculpa, paga um bom vinho e, tudo se acerta, pois,
na verdade, o ódio nasce de um não reconhecimento de alguma situação.
Resolvendo o ponto, pode-se prosseguir. Claro, existem pessoas incapazes de
perdoar, mas, nesse caso, estamos falando de pessoas saudáveis.
Já
a indiferença é horrível afinal não reconhece objeto. É como se o outro sequer
existisse no mundo. Um exemplo disto, que você pode ver ainda hoje, são os
pedintes na rua. Algumas pessoas passam, ao lado, e não percebem a existência
de um morador de rua, uma mãe com uma criança no colo ou um menor sendo mal
tratado pela vida. Mais ou menos como se pertencessem à outra dimensão fora da
percepção humana. Isto é indiferença.
O
grande problema reside na questão que a indiferença está ganhando espaço em
quase todas as modalidades de atuação do seu humano.
Estamos
nos tornando indiferentes a tudo: ilegalidade, violência, falta de pudor, risco
a doenças, alimentação e, o mais importante, a outros seres humanos. Como se
algo maior ocupasse todo o espaço de nossa humanidade. Claro que temos um nome
para isso também, chamasse ego!
A
indiferença é, portanto, irmã gêmea (univitelina) do egoísmo. Quanto mais
centrado em nós estamos, mais indiferentes a tudo ficamos, desde que, não venha
a ferir alguma coisa que julgamos ser nossa por direito. A sociedade marcha
para uma apatia extrema onde só os interesses pessoais (extremos) são percebidos
pelo sujeito principal. Aliás, o mundo passa a girar em torno dele.
Tente
fazer uma pesquisa sobre isto usando apenas sua observação pessoal. Veja o
movimento das pessoas nas ruas, a arrumação das filas, as conversas de elevador
(existem?). Sim, o futuro nos reserva algo muito ruim se o ritmo continuar como
está, porém, devo acrescentar, nem tudo está totalmente perdido.
Outro
dia estava indo para o consultório bem cedo e uma cena impressionante chamou a
atenção de todos na Rua Barata Ribeiro quase esquina com Siqueira Campos em
Copacabana (Rio). A Barata Ribeiro (tal qual a Av. Nsa. De Copacabana) têm um
trânsito infernal a qualquer hora do dia ou da noite, pela manhã então nem se
fala, é algo dantesco pela quantidade de ônibus, carros, caminhões e táxis.
Raro mesmo é se ver uma bicicleta, coisa que é foco desta narrativa.
Um
senhor de idade estava atravessando, fora da faixa, empurrando uma bicicleta de
carga cheia de laranjas. Havia uma pilha de laranjas acima no nível do
compartimento de transporte. O sinal abriu! Ele estava no meio da rua e se
assustou com as buzinas. A bicicleta caiu e dezenas de laranjas rolaram por
toda extensão da Rua Barata Ribeiro.
Um
momento de absoluta tensão. Um ônibus tinha acelerado violentamente, ao abrir no
sinal, parou quase encostando ao pobre homem, que, trêmulo, acabou caindo sobre
a bicicleta. O que se passou a seguir demonstra que ainda existe esperança para
a raça humana.
O
motorista desceu do ônibus para ajudar a catar as laranjas. Todo o trânsito
parou, ninguém teve coragem de esmagar as frutas que ainda rolavam aqui e ali.
Outros motoristas também deixaram seus carros para ajudar o velho senhor a se
erguer com sua bicicleta, o guarda municipal deixou a movimentada esquina e se
juntou ao mutirão de catadores de laranja.
Confesso
que a cena me paralisou de tal forma que nem ao menos me lembrei de filmar ou
tirar um foto com o celular. Fiquei olhando, congelado no tempo, e, por alguns
momentos, esqueci se estava indo ou, vindo de algum lugar.
Todo
episódio durou algo em torno de quatro ou cinco minutos no máximo. Todas as
laranjas de volta a recipiente e o senhor tendo sua dramática travessia
finalizada. Entretanto, acredito, irá permanecer para sempre na memória dos
atores envolvidos e nos espectadores (como eu) que lá estiveram.
Claro
que, alguns instantes depois, a rua se tornou novamente impessoal e a vida
seguiu seu rumo. Quem sabe, com alguma correção na rota.
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