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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

A Substância




Por João Oliveira

                Após uma tempestade de fortes raios, um homem encontrou uma árvore envolvida em uma estranha substância. Algo que se movia com o vento, brilhava e destruía tudo que tocava, transformando em cinzas. Parecia estar viva e se rebelando contra o ambiente.

                Era uma época diferente de hoje. As pessoas não tinham palavras e transmitir conhecimento não era algo fácil. Sem os signos linguísticos, os gestos e os urros eram as únicas coisas que possuíam para duplicar experiências.

                Assim, aquele homem ficou parado olhando a beleza da espetacular substância.

                Não demorou muito para perceber que ela aquecia nas noites, ajudava a tornar os alimentos mais saborosos e, com muito cuidado, podia ser transportada de um lugar para o outro quando se agarrava aos galhos secos.

                Justamente essa tornou-se a missão de sua vida: manter aquela essência ativa. Todas às vezes que ela parecia estar se dissipando, ele soprava com a boca, juntava pequenas folhas secas e o substrato voltava a dançar no ar rebelde como sempre.

                Dia após dia pessoas vinham de longe buscar um pouco dessa maravilhosa substância da qual ele se tornou mantenedor. Traziam alimentos em troca de poder impregnar pedaços de madeiras com aquele brilho vivo e voltarem para suas cavernas felizes e satisfeitos. Nem todos tinham o mesmo cuidado em manter a atividade constante da substância e, quase sempre, as mesmas pessoas voltavam para pedir mais um pouco.

                Dessa forma, o cotidiano do nosso personagem se tornou repleto de visitas constantes e aquilo era o seu único modo de viver. Isso durou muito tempo mas, um dia, uma chuva torrencial destruiu completamente qualquer vestígio daquela estranha matéria. Ela simplesmente havia desaparecido junto com as águas que caíram do céu.

                Atordoado o homem soprou como pôde em galhos secos. Juntou tantas folhas que fez um enorme monte no meio da floresta. Nada disso trouxe o calor da substância de volta.

                Em um momento de fúria, já quase anoitecendo, ele atirou uma pedra com força no chão. A pedra se chocou com outra que estava no solo e, nesse momento, ele pôde ver uma pequena fração da substância surgir bailando no ar. Algo diminuto que ele sabia ser o início de uma nova possibilidade.

                Passou o resto da noite batendo nas pedras até que descobriu um tipo perfeito que, com maior facilidade, fazia aparecer as partículas da substância no ar. Fez o mesmo movimento próximo as folhas secas e, com a ajuda de seu sopro, surgiu o esplendor daquilo que buscava.

                Agora era o detentor e podia distribuir a magia onde quer que fosse, pois era capaz de transformar a matéria. Suas pedras, suas faíscas faziam surgir o fogo. 

                Muitas vezes nos apegamos a algo (trabalho, pessoas, lugares) como se fosse o motivo de nossa existência, apenas por acreditar que tal estrutura só existe por conta de nossa devoção. Isto é falso. Lembre-se que quando algo se apagar, podemos fazer surgir chamas de pequenas faíscas e construir um novo fogo dentro de nós.
               

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